sexta-feira, 9 de julho de 2010

O Cortiço



Tendo como cenário uma habitação coletiva, o romance difunde as teses naturalistas, que explicam o comportamento dos personagens com base na influência do meio, da raça e do momento histórico

Ao ser lançado, em 1890, O Cortiço teve boa recepção da crítica, chegando a obscurecer escritores do nível de Machado de Assis. Isso se deve ao fato de Aluísio de Azevedo estar mais em sintonia com a doutrina naturalista, que gozava de grande prestígio na Europa. O livro é composto de 23 capítulos, que relatam a vida em uma habitação coletiva de pessoas pobres (cortiço) na cidade do Rio de Janeiro.
O romance tornou-se peça-chave para o melhor entendimento do Brasil do século XIX. Evidentemente, como obra literária, ele não pode ser entendido como um documento histórico da época. Mas não há como ignorar que a ideologia e as relações sociais representadas de modo fictício em O Cortiço estavam muito presentes no país.

RIGOR CIENTÍFICO
Essa criação de Aluísio de Azevedo tem como influência maior o romance L’Assommoir, do escritor francês Émile Zola, que prescreve um rigor científico na representação da realidade. A intenção do método naturalista era fazer uma crítica contundente e coerente de uma realidade corrompida. Zola e, neste caso, Aluísio combatem, como princípio teórico, a degradação causada pela mistura de raças.
Por isso, os dois romances naturalistas são constituídos de espaços nos quais convivem desvalidos de várias etnias. Esses espaços se tornam personagens do romance.

É o caso do cortiço, que se projeta na obra mais do que os próprios personagens que ali vivem. Um exemplo pode ser visto no seguinte trecho:

“E durante dois anos o cortiço prosperou de dia para dia, ganhando forças, socando-se de gente. E ao lado o Miranda assustava-se, inquieto com aquela exuberância brutal de vida, aterrado defronte daquela floresta implacável que lhe crescia junto da casa, por debaixo das janelas, e cujas raízes, piores e mais grossas do que serpentes, minavam por toda a parte, ameaçando rebentar o chão em torno dela, rachando o solo e abalando tudo.”

O narrador compara o cortiço a uma estrutura biológica (floresta), um organismo vivo que cresce e se desenvolve, aumentando as forças daninhas e determinando o caráter moral de quem habita seu interior.

NARRADOR
A obra é narrada em terceira pessoa, com narrador onisciente (que tem conhecimento de tudo), como propunha o movimento naturalista. O narrador tem poder total na estrutura do romance: entra no pensamento dos personagens, faz julgamentos e tenta comprovar, como se fosse um cientista, as influências do meio, da raça e do momento histórico.

O foco da narração, a princípio, mantém uma aparência de imparcialidade, como se o narrador se apartasse, à semelhança de um deus, do mundo por ele criado. No entanto, isso é ilusório, porque o procedimento de representar a realidade de forma objetiva já configura uma posição ideologicamente tendenciosa.

TEMPO

Em O Cortiço, o tempo é trabalhado de maneira linear, com princípio, meio e desfecho da narrativa. A história se desenrola no Brasil do século XIX, sem precisão de datas. Há, no entanto, que ressaltar a relação do tempo com o desenvolvimento do cortiço e com o enriquecimento de João Romão.

ESPAÇO

São dois os espaços explorados na obra. O primeiro é o cortiço, amontoado de casebres mal-arranjados, onde os pobres vivem. Esse espaço representa a mistura de raças e a promiscuidade das classes baixas. Funciona como um organismo vivo. Junto ao cortiço estão a pedreira e a taverna do português João Romão.

O segundo espaço, que fica ao lado do cortiço, é o sobrado aristocratizante do comerciante Miranda e de sua família. O sobrado representa a burguesia ascendente do século XIX. Esses espaços fictícios são enquadrados no cenário do bairro de Botafogo, explorando a exuberante natureza local como meio determinante. Dessa maneira, o sol abrasador do litoral americano funciona como elemento corruptor do homem local.

ENREDO

O livro narra inicialmente a saga de João Romão rumo ao enriquecimento. Para acumular capital, ele explora os empregados e se utiliza até do furto para conseguir atingir seus objetivos. João Romão é o dono do cortiço, da taverna e da pedreira. Sua amante, Bertoleza, o ajuda de domingo a domingo, trabalhando sem descanso.

Em oposição a João Romão, surge a figura de Miranda, o comerciante bem estabelecido que cria uma disputa acirrada com o taverneiro por uma braça de terra que deseja comprar para aumentar seu quintal. Não havendo consenso, há o rompimento provisório de relações entre os dois.

Com inveja de Miranda, que possui condição social mais elevada, João Romão trabalha ardorosamente e passa por privações para enriquecer mais que seu oponente. Um fato, no entanto, muda a perspectiva do dono do cortiço. Quando Miranda recebe o título de barão, João Romão entende que não basta ganhar dinheiro, é necessário também ostentar uma posição social reconhecida, freqüentar ambientes requintados, adquirir roupas finas, ir ao teatro, ler romances, ou seja, participar ativamente da vida burguesa.

No cortiço, paralelamente, estão os moradores de menor ambição financeira. Destacam-se Rita Baiana e Capoeira Firmo, Jerônimo e Piedade. Um exemplo de como o romance procura demonstrar a má influência do meio sobre o homem é o caso do português Jerônimo, que tem uma vida exemplar até cair nas graças da mulata Rita Baiana. Opera-se uma transformação no português trabalhador, que muda todos os seus hábitos.

A relação entre Miranda e João Romão melhora quando o comerciante recebe o título de barão e passa a ter superioridade garantida sobre o oponente. Para imitar as conquistas do rival, João Romão promove várias mudanças na estalagem, que agora ostenta ares aristocráticos.
O cortiço todo também muda, perdendo o caráter desorganizado e miserável para se transformar na Vila João Romão.

O dono do cortiço aproxima-se da família de Miranda e pede a mão da filha do comerciante em casamento. Há, no entanto, o empecilho representado por Bertoleza, que, percebendo as manobras de Romão para se livrar dela, exige usufruir os bens acumulados a seu lado.
Para se ver livre da amante, que atrapalha seus planos de ascensão social, Romão a denuncia a seus donos como escrava fugida. Em um gesto de desespero, prestes a ser capturada, Bertoleza comete o suicídio, deixando o caminho livre para o casamento de Romão.

ALEGORIA DO BRASIL

Mais do que empregar os preceitos do naturalismo, a obra mostra práticas recorrentes no Brasil do século XIX. Na situação de capitalismo incipiente, o explorador vivia muito próximo ao explorado, daí a estalagem de João Romão estar junto aos pobres moradores do cortiço. Ao lado, o burguês Miranda, de projeção social mais elevada que João Romão, vive em seu palacete com ares aristocráticos e teme o crescimento do cortiço. Por isso pode-se dizer que O Cortiço não é somente um romance naturalista, mas uma alegoria do Brasil.

O autor naturalista tinha uma tese a sustentar sua história. A intenção era provar, por meio da obra literária, como o meio, a raça e a história determinam o homem e o levam à degenerescência.
A obra está a serviço de um argumento. Aluísio se propõe a mostrar que a mistura de raças em um mesmo meio desemboca na promiscuidade sexual, moral e na completa degradação humana. Mas, para além disso, o livro apresenta outras questões pertinentes para pensar o Brasil, que ainda são atuais, como a imensa desigualdade social.


Fonte:
http://guiadoestudante.abril.com.br/estude/literatura/materia_415646.shtml


quinta-feira, 8 de julho de 2010

Macunaíma

Capitães da Areia

Memórias de um Sargento de Milícias

O Auto da Barca do Inferno

A Cidade e as Serras

Dom Casmurro

O Cortiço

Iracema

Vidas Secas

Memórias Póstumas de Brás Cubas - Análise



INTRODUÇÃO


Publicado em 1881, Memórias Póstumas de Brás Cubas, além de inaugurar o Realismo brasileiro, apresenta as mais radicais experimentações na prosa do país até então. Narrado por um defunto, de forma digressiva e agressiva, o romance apresenta a vida inútil e desperdiçada do anti-herói Brás Cubas. Utilizando recursos narrativos e gráficos inusitados, Machado surpreende a cada página com sua ironia cortante e, acima de tudo, com a inteligência que prende até o leitor mais desconfiado. Antecipando procedimentos modernistas e descobertas da psicanálise, esta obra ácida e irônica de Machado de Assis eleva a literatura brasileira a um patamar jamais antes atingido.

DO ROMANTISMO AO REALISMO

A obra de Machado de Assis pode ser dividida em dois momentos bem distintos: as obras da juventude, com forte influência do Romantismo e seu progressivo amadurecimento, até chegar ao Realismo de suas obras da maturidade. Entre estas, as mais destacadas e consideradas são Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891) e Dom Casmurro (1899). Se os escritores românticos, José de Alencar à frente, conseguiram estabelecer o romance como um gênero literário de respeito no Brasil, foi Machado de Assis quem elevou a prosa brasileira ao nível das melhores escritas no mundo em sua época. Sua obra não almeja mais apenas divertir, moralizar ou afirmar valores nacionais, mas visa esmiuçar o espírito humano, refletindo sobre valores universais, sem jamais perder de vista a realidade brasileira.

O PRIMEIRO ROMANCE PSICOLÓGICO

Com Memórias Póstumas de Brás Cubas a literatura brasileira atingiu a sua maturidade. Marco inicial do Realismo, introduz o romance psicológico na Literatura brasileira. Nesta obra, Machado de Assis desloca o foco de interesse do romance. O seu enfoque central não é a vida social ou a descrição das paisagens, mas a forma como seus personagens vêem e sentem as circunstâncias em que vivem. Em vez de enfatizar os espaços externos, investe na caracterização interior dos personagens, com suas contradições e problemáticas existenciais.

DOIS TIPOS DE REALISMO

O chamado Realismo na Literatura brasileira compreende duas manifestações literárias muito diferentes, ambas marcadas pela oposição à tendência idealizante do Romantismo e pela atitude crítica em relação à sociedade.

De um lado temos o Realismo propriamente dito, ou Realismo Psicológico, inaugurado por Memórias Póstumas de Brás Cubas; de outro, o Realismo-Naturalismo, cujo marco inicial é o romance O Mulato, também de 1881, de Aluísio Azevedo (1857-1913).

A obra mais importante do Realismo-Naturalismo é O Cortiço, de Aluísio Azevedo, editado em 1890. No livro de Azevedo, a trama desenvolve-se em uma habitação coletiva do Rio de Janeiro, onde vivem e circulam operários, prostitutas e personagens das mais variadas classes sociais. A composição desses tipos e do enredo tem a intenção de descrever objetivamente a vida de uma determinada sociedade e retratar seu funcionamento. O Realismo-Naturalismo é cientificista e determinista, considerando que as ações humanas são produtos de leis naturais: do meio, das características hereditárias e do momento histórico.

Já o Realismo Psicológico de Machado de Assis despreza tanta objetividade. O escritor concentra sua narrativa na visão de mundo de seus personagens, expondo suas contradições. A classificação mais adotada para definir a escola literária a que pertence Machado de Assis na segunda fase de sua obra é Realismo Psicológico. O recurso que ele utiliza para discutir a sociedade é a abordagem, em profundidade, da individualidade e do caráter dos personagens.

POUCA AÇÃO E MUITAS SURPRESAS

Na abertura do livro, uma dedicatória escrita sob a forma de um epitáfio anuncia o narrador desse romance inusitado: Brás Cubas, um defunto-autor que começa contando detalhes do seu funeral. Depois de algumas digressões, ele retoma a ordem cronológica dos acontecimentos, relatando a infância e a primeira paixão da adolescência, aos 17 anos, pela cortesã Marcela. Presenteia tanto a amada que o pai, irritado com o gasto excessivo, manda-o estudar Direito em Coimbra, Portugal.

Assim como foi, também volta a chamado do pai porque a mãe está à morte. Namora então Eugênia, a filha de uma amiga pobre da família, enquanto o pai procura arranjar um casamento de interesse com Virgília, a filha de um político, o Conselheiro Dutra. Ela, no entanto, casa-se com um político, Lobo Neves, e posteriormente se torna amante de Brás, mantendo com ele encontros na casa habitada por dona Plácida. Antes de o caso começar, morre o pai de Brás. Começa então um litígio entre ele e a irmã Sabina pela herança.

Em meio a tudo isso, o protagonista Brás reencontra Quincas Borba, amigo dos tempos de escola, que lhe apresenta uma doutrina filosófica que criara, o Humanitismo. Virgília parte para o Norte, acompanhando o marido, nomeado presidente de província. Brás namora então a sobrinha do cunhado Cotrim, mas a garota morre aos 19 anos. Ele, que já se tornara deputado, fracassa na tentativa de virar ministro de Estado. Frustrado, funda um jornal de oposição. Percebe, então, que Quincas Borba está enlouquecendo progressivamente.

Procurado por Virgília, já idosa, Brás ampara dona Plácida, que morre pouco depois. É um período cheio de perdas e decepções: morrem Marcela, o louco Quincas Borba, Lobo Neves e Eugênia aparece em um cortiço. Ao tentar inventar um emplasto que lhe daria a fama tão desejada, Brás Cubas adoece e recebe a visita da ex-amante Virgília e do filho dela. Morre depois de um delírio, aos 64 anos. Decide, então, contar sua vida em detalhes, mas, pouco sistemático que é, e ainda excitado pela experiência da morte, sua narrativa segue a lógica do pensamento.

O caráter inovador de Memórias Póstumas de Brás Cubas não está na história propriamente dita ou na seqüência cronológica dos fatos. A melhor chave para compreender a obra são as reflexões do personagem, como elas se encadeiam e se misturam aos eventos que ele vive.

NARRADOR – O PERSONAGEM CENTRAL

O romance tem uma perspectiva deslocada: é narrado por um defunto, que reconta a própria vida, do fim para o começo, num relato marcado pela franqueza e inseção. "Falo sem temer mais nada", diz o morto. É Brás Cubas, personagem “esférico”, ou seja, de grande densidade psicológica, quem comenta as próprias mudanças. Brás Cubas, classificado pelos críticos como o grande hipócrita da Literatura brasileira, é um sujeito sem objetivos e muito contraditório, sempre rondando a periferia do poder. Típico burguês da segunda metade do século XIX, encarna o homem que passou a vida sem conquistar nenhuma realização efetiva.
Se na infância o personagem fora uma criança abastada e protegida, torna-se um jovem adulto leviano, em busca da melhor maneira de tirar vantagem. Sua conduta fica explícita quando descreve sua formação universitária na Europa:

“Não digo que a Universidade me não tivesse ensinado alguma; mas eu decorei-lhe só as fórmulas, o vocabulário, o esqueleto. Tratei-a como tratei o latim – embolsei três versos de Virgílio, dois de Horácio, uma dúzia de locuções morais e política para as despesas da conversação. Tratei-os como tratei a história e a jurisprudência. Colhi de todas as coisas a fraseologia, a casca, a ornamentação (...)"

Quando volta ao Brasil, por causa da doença da mãe, se defronta pela primeira vez com a questão da morte e vive então um momento de introspecção e reflexão. Quando reencontra Marcela velha e doente, retoma a idéia da passagem do tempo. A isso Brás chama de teoria das edições da vida, anunciada nos primeiros capítulos, mas comentada muito depois.

“Pois sabei que, naquele tempo, estava eu na quarta edição, revista e emendada, mas ainda inçada de descuidos e barbarismos; defeito que, aliás, achava alguma compensação no tipo, que era elegante, e na encadernação, que era luxuosa.”

Na maturidade, começa a buscar a compensação pela existência sem nada de notável, sem filhos ou realizações: consegue um cargo público, busca notoriedade e respeitabilidade ao querer tornar-se ministro. Pouco antes de morrer, imagina ainda um último modo de se perpetuar: inventando um emplasto, uma medicação sublime.

PERSONAGENS COMPLEMENTARES

Os personagens criados por Machado de Assis entram e saem de cena conforme os pensamentos de Brás Cubas. Entre eles, quem merece maior destaque é Quincas Borba, que, mais tarde, será o personagem-título de outro romance do autor. Ele influencia profundamente o narrador com a sua teoria do Humanitismo. Os dois conheceram-se no colégio e reencontram-se muitos anos depois. Quincas é um mendigo que vai enlouquecendo progressivamente.

Ao morrer, está completamente fora de si. Seu Humanitismo prega que tudo o que acontece na vida faz parte de um quadro maior de preservação da essência humana. A ironia é uma das marcas da obra de Machado de Assis. Nesta obra isso fica claro quando o autor faz com que uma doutrina de valorização da vida seja defendida justamente por um mendigo que morre completamente louco.

No contexto do romance, o Humanitismo convém a Brás para justificar sua existência vazia. A teoria de Quincas Borba dá a ele uma ilusão da descoberta de um sentido para a vida. A morte de Quincas Borba reconduz Brás Cubas ao confronto com a vacuidade de sua existência. Machado confirma assim a tese anunciada no Capítulo 7 – “O delírio”, sobre a perseguição inútil da felicidade.

Quincas Borba é importante porque introduz Brás Cubas na teoria que inventou, o Humanitismo. Na verdade, a teoria do mendigo é uma caricatura que Machado de Assis faz do positivismo e do evolucionismo, teorias científicas e filosóficas em voga na época que atribuem sentido de evolução mesmo às fatalidades da vida.

AS INOVAÇÕES DE MACHADO DE ASSIS

Escritor dedicado à problematização e ao questionamento da função da Literatura, Machado de Assis inova, neste livro, a temática, a estrutura e a linguagem.

Na temática, investe na complexidade dos indivíduos, que retrata sem nenhuma idealização romântica:

“(...) Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis (...)”

Aqui, por exemplo, constrói uma frase realista típica, contrapondo ao romantismo do envolvimento de 15 meses os 11 contos de réis. Ao contrário dos personagens românticos, que se movem por um objetivo, e estabelecem metas ou fazem algo notável, a trajetória de Brás Cubas e dos personagens que o circundam nada tem de especial. Muitas vezes, eles se norteiam, como no caso de Marcela, pelo mais vil dos interesses. No final da vida, Brás Cubas conclui que precisa deixar alguma realização e se anima com a idéia de criar um emplasto com seu nome, algo que o tornaria famoso.

A estrutura de Memórias Póstumas de Brás Cubas tem uma lógica narrativa surpreendente e inovadora. A seqüência do livro não é determinada pela cronologia dos fatos, mas pelo encadeamento das reflexões do personagem. Uma lembrança puxa a outra e o narrador Brás Cubas, que prometera contar uma determinada história, comenta todos os outros fatos que a envolvem, para retomar o tema anunciado muitos capítulos depois. Organizados em blocos curtos, os 160 capítulos de Memórias Póstumas de Brás Cubas fluem segundo o ritmo do pensamento do narrador. A aparente falta de coerência da narrativa, permeada por longas digressões, dissimula uma forte coerência interna, oferecendo ao leitor todas as informações para conhecer a visão de mundo de um homem que passou pela vida sem realização nenhuma, apenas ao sabor de seus desejos. Logo nas primeiras páginas, o escritor brinca com a expectativa do leitor de chegar logo às ações do romance. Machado de Assis, por intermédio do seu narrador, se dirige diretamente ao leitor, metalingüisticamente, para comentar o livro. Diz Brás Cubas:

“Veja o leitor a comparação que melhor lhe quadrar, veja-a e não esteja daí a torcer-me o nariz, só porque ainda não chegamos à parte narrativa destas memórias. Lá iremos. Creio que prefere a anedota à reflexão, como os outros leitores, seus confrades, e acho que faz muito bem”.

Ao usar a metalinguagem, Machado convida o leitor a refletir sobre a estrutura da obra e perceber dois níveis de leitura: a que revela diretamente o personagem e a que o faz objeto de crítica do autor.

Machado de Assis foi o mais ousado dos escritores brasileiros anteriores ao Modernismo (1922) na experimentação de novas formas de expressão. Em Memórias Postumas de Brás Cubas mostra sua desconfiança da articulação perfeita entre o texto e a realidade e procura adequar a forma ao conteúdo. Exemplo: para traduzir a frustração de Brás Cubas quando não consegue se tornar ministro, a solução do autor foi deixar o Capítulo 139 em branco. No capítulo seguinte, explica:

“Há coisas que melhor se dizem calando; tal é a matéria do capítulo anterior”.

O autor também questiona a forma tradicional de expressão, acreditando que falta a ela a capacidade plena de levar ao leitor os sentimentos do personagem. É essa preocupação que faz Machado de Assis subverter a forma para adaptá-la ao conteúdo que deseja transmitir, como neste trecho do Capítulo 55 – “O velho diálogo de Adão e Eva” –, em que descreve o auge da paixão entre Brás Cubas e Virgília:


Capítulo LV - O Velho Diálogo de Adão e Eva

Brás Cubas
. . . . . ?
Virgília
. . . . . .

Brás Cubas
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . .

Virgília
. . . . . . !

Brás Cubas
. . . . . . .

Virgília
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . ? . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Brás Cubas
. . . . . . . . . . . . . . . . . .

Virgília
. . . . . . .

Brás Cubas
. . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . ! . . . . . .
. . ! . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . . !

Virgília
. . . . . . . . . . . . . . . . . ?

Brás Cubas
. . . . . . . !

Virgília
. . . . . . . !


A ironia é um dos traços mais marcantes da obra de Machado de Assis e aparece ainda mais acentuada nos chamados romances da maturidade. Pode ser entendida como mais um recurso para combater as verdades absolutas, das quais desacreditava por princípio. A construção irônica prevê sempre outros sentidos para o que é dito.

Machado de Assis utiliza-se da ironia como um recurso para fazer o leitor desconfiar das declarações, pensamentos e conclusões do narrador Brás Cubas.

Ao comentar, no primeiro capítulo, sobre o amigo que lhe presenteia com um empolado discurso fúnebre, o narrador agradece as palavras ditas em tom de comoção exagerada com uma frase certeira:

“Bom e fiel amigo! Não, não me arrependo das vinte apólices que lhe deixei".

A digressão é outro elemento importante da linguagem machadiana. Consiste na interrupção do fluxo narrativo, que envereda por assuntos desvinculados do tema inicial, mas mantendo com ele alguma analogia criada pela mente de quem conta. Essa analogia, com algum esforço, pode ser percebida pelo leitor, desde que ele se mantenha atento.

O leitor de Machado é constantemente solicitado a interagir criticamente com a obra, distanciando-se ainda mais do modelo de leitura proposto pelos romances românticos, que mobilizam a emoção e a imaginação.

É o que acontece, por exemplo, na parte inicial do romance, quando Brás Cubas deixa em suspenso por vários capítulos a explicação para sua morte, que prometera desde o início, para passear descomprometidamente por assuntos tão díspares quanto as pirâmides do Egito e a sua árvore genealógica. Quando volta a falar da causa mortis, é para comentar, com ironia "...acabemos de uma vez com o nosso emplasto”. Como se já tivesse explicado antes do que se tratava!


VIDA E OBRA


O gênio que veio do morro


Nascido no Morro do Livramento, no Rio de Janeiro, filho de mulato em uma sociedade ainda escravocrata, paupérrimo, sofrendo de gagueira e epilepsia, nada indicaria que Joaquim Maria Machado de Assis teria, ao morrer em 1908, um enterro de estadista, seguido por milhares de admiradores pelas ruas da cidade em que nasceu, viveu e morreu. Autodidata, aos 15 começa a trabalhar em tipografias, onde conhece escritores importantes, como Manuel Antônio de Almeida. Em 1855 inicia sua carreira literária com a publicação de um poema na revista Marmota Fluminense. Consegue, logo depois, um emprego na Secretaria da Fazenda. Trabalha a vida toda na burocracia, na qual vai galgando posições até ser Ministro substituto. Mas a carreira burocrática é apenas uma forma de ganhar o sustento, ainda que humilde, que o possibilita escrever. Contribui com diversos jornais e revistas e, com a publicação de seus livros de poesia, contos e romances, só vai ganhando em notoriedade e respeito. Em 1869, casa-se, enfrentando grave preconceito racial da família, com a portuguesa Carolina Augusta Xavier de Novais. Em 1876, antes mesmo de publicar a parcela de sua obra mais significativa, já é considerado, na companhia de José de Alencar, um dos maiores escritores brasileiros. Em 1881 inicia a publicação dos seus romances realistas. Em 1896 é um dos principais responsáveis pela fundação da Academia Brasileira de Letras, do qual é eleito presidente vitalício. Em 1904 morre Carolina. Quatro anos depois, Machado de Assis, consagrado como o maior escritor brasileiro, é enterrado com pompa no Rio de Janeiro. O mulato paupérrimo do Morro do Livramento tornara-se um dos homens mais respeitados do país.

O poeta

Machado de Assis iniciou sua carreira literária como poeta. Seu livro de estréia foi Crisálidas (1864), que lhe conferiu imediata notoriedade. Embora sua poesia esteja muito aquém da prosa que o imortalizou, nunca deixou de escrever poemas. Em 1870 lança Falenas, em 1875, Americanas e, em 1901, as suas Poesias Completas, que ainda não incluem um dos seus mais famosos poemas, o belo soneto A Carolina, escrito após a morte da esposa, em 1904.

O cronista

Seguindo a linha dos textos de Ao Correr da Pena, de José de Alencar, Machado de Assis contribuiu durante toda a sua carreira com textos breves para jornais, em que comenta os mais variados assuntos da vida do Rio de Janeiro e do país. Esses textos leves, de temática cotidiana, podem ser considerados os precursores da crônica moderna, em que se haveriam de destacar, no século seguinte, escritores como Rubem Braga, Fernando Sabino e Carlos Drummond de Andrade. A produção do Machado cronista se inicia já em 1859 e se estende até 1904, com raras interrupções. Sua produção mais madura foi publicada na colunas do jornal Gazeta de Notícias, em que contribui de 1881 a 1904: Balas de Estalo (1883-1885), Bons Dias! (1888-1889) e principalmente em A Semana (1892-1897).

O crítico

Também para os jornais, Machado de Assis escreveu durante toda a vida textos críticos. Sua produção infindável envolve ensaios teóricos, como O passado, o presente e o futuro da nossa literatura (1858), O ideal do crítico (1865) e Notícia da atual literatura brasileira - instinto de nacionalidade (1873), diversas resenhas críticas importantes, como aquela ao livro O Primo Basílio, de Eça de Queirós (1878) e inúmeras críticas de teatro.

O contista

Muitos das centenas de contos que Machado de Assis escreveu ao longo da vida se perderam, com o desaparecimento dos números dos jornais em que foram publicados. Outros estão apenas agora sendo republicados em livro. Sua versatilidade como contista é imensa. Escreveu tanto para os jornais mais sentimentalóides quanto para publicações seriíssimas. A qualidade dos contos varia de acordo com a publicação e o público leitor a que se destinavam. Entre as coletâneas de contos que publicou, destacam-se Papéis Avulsos (1882), com o grande conto, ou novela, O Alienista, Teoria do Medalhão e O Espelho, e Várias Histórias (1896) em que se encontram, entre outras obras-primas da concisão e do impacto narrativo, A Causa Secreta, A Cartomante e Um Homem Célebre.

A fase romântica

Entre 1872 e 1878, Machado de Assis começa a publicar romances. Ainda muito influenciado pelo amigo e mestre José de Alencar, publica, com regularidade britânica, um romance a cada dois anos. Em Ressurreição (1872), A Mão e a Luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878), temos um Machado ainda romântico, mas antecipando alguns temas e procedimentos de suas obras-primas realistas e, principalmente, conquistando um público leitor que já receberia sua revolução realista com boa vontade.

As obras-primas realistas

A mais importante fase da carreira de Machado de Assis concentra-se na trilogia de romances realistas publicados no final do século. O primeiro deles foi Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881). Depois, seguiram-se:

Quincas Borba (1891) narra, na terceira pessoa, as desventuras do ingênuo Rubião, herdeiro da fortuna e do cachorro da enlouquecida personagem Quincas Borba, que já aparecia, e morria, no livro anterior. Através dessa personagem, cômica no seu despreparo para as armadilhas da corte, e trágica no seu destino, Machado ao mesmo tempo ironiza e demonstra as teorias darwinistas tão caras aos naturalistas. O ensandecido "humanitismo" de Quincas Borba, herdeiro direto da "luta pela vida" de Darwin, é sintetizado na frase "Ao vencedor, as batatas!", e acaba por ser comprovado tragicamente pela ação espoliadora do casal Sofia / Palha sobre o provinciano protagonista.

Dom Casmurro (1899) apresenta algumas das personagens mais complexas da literatura universal. Narrado pelo velho Bento Santiago, apelidado Dom Casmurro, apresenta a história de seu relacionamento - namoro, casamento e afastamento - com Capitu, sua vizinha de infância. O narrador se esforça por demonstrar o caráter ambíguo e dissimulado tanto de sua esposa quanto de seu melhor amigo, o hábil Escobar, para assim justificar sua convicção de ter sido por eles traído. Como prova da traição, apresenta a semelhança que enxerga em seu filho, Ezequiel, com o amigo, que supõe pai da criança. Mas o esforço é vão. Se consegue construir a imagem de personagens extremamente complexos, nada nos consegue provar, pois o seu próprio caráter é tão fraco, tão inseguro e titubiante, que o leitor passa a desconfiar de seus julgamentos. Assim, além de construir a eterna dúvida (Capitu traiu ou não Bentinho?), Machado de Assis apresenta o primeiro narrador não confiável da literatura brasileira.

Os últimos romances

Esaú e Jacó (1904) e Memorial de Aires (1908), têm o mesmo narrador personagem, o conselheiro Aires, que pouco age e passa a maior parte da narrativa contemplando placidamente as aventuras amorosas e existenciais dos jovens ao seu redor. A descrição dos dias de perplexidade da população carioca com a proclamação da República, em Esaú e Jacó, é um dos pontos altos da narrativa machadiana.

A Academia Brasileira de Letras

Fundada em 1896, foi um dos mais acalentados sonhos de Machado de Assis no final da vida. Eleito seu primeiro presidente, Machado via na fundação da Academia, nos moldes da Academia Francesa, uma possibilidade de dignificar o trabalho do escritor, acabando com a imagem de malandro boêmio que viera do romantismo, e afirmando-o como um intelectual sério e conseqüente.

Fonte:
http://fredb.sites.uol.com.br/mpbc.html

Memórias póstumas de Brás Cubas



Memórias póstumas de Brás Cubas é um romance do escritor brasileiro Machado de Assis, considerado divisor de águas em sua carreira. O livro costuma ser associado à introdução do Realismo no Brasil. É narrado em primeira pessoa pelo personagem Brás Cubas, que em tom irônico e sarcástico, descreve sua biografia e suas obras.

Uma das mais populares obras do autor, o romance Memórias Póstumas de Bras Cubas foi publicado originalmente como um folhetim, em 1880, em capítulos, como na Revista Brasileira. Em 1881, saiu em livro causando espanto à crítica da época, que se perguntava se o livro tratava-se de fato de um romance: a obra era extremamente ousada do ponto de vista formal, surpreendendo o público até então acostumado à tradicional fórmula romântica. É narrada pelo defunto Brás Cubas, que escreve a própria biografia a partir do túmulo (sendo, portanto, segundo o próprio, não um autor-defunto, mas o primeiro defunto-autor da história, que é caracterizado por ter morrido e depois escrito, diferente do outro que foi escritor depois morreu). Começa suas memórias com uma dedicatória que antecipa o humor negro e a ironia presente em todo o livro: Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico com saudosa lembrança estas Memórias Póstumas. Brás Cubas também expressa o humor negro quando diz que a obra foi escrita com a pena da galhofa e a tinta da melancolia, no "Ao leitor".
“ Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver, dedico, com saudosa lembrança, estas memórias póstumas ”— Dedicatória da obra - notem o humor negro e os traços realistas, presentes desde a dedicatória

Foi a obra brasileira que melhor ilustrou a tendência do "leitor incluso", um contraponto dialógico com o leitor, não apenas como um vocatico, mas dando ao leitor vida própria e contornos no interior do texto. O leitor é visto com possuidor de posicionamento crítico, gestos e temperamento. Estes trechos que incluem o leitor têm sempre uma natureza baseada numa reflexão, uma metalinguagem da estrutura e corrente ideológica do texto.
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Ensaio sobre a cegueira



Esta obra, de José Saramago, faz uma intensa crítica aos valores da sociedade, e ao que acontece quando um dos sentidos vitais falta à população.

A cegueira começa num único homem, durante a sua rotina habitual. Quando está sentado no semáforo, este homem tem um ataque de cegueira, e é aí, com as pessoas que correm em seu socorro que uma cadeia sucessiva de cegueira se forma… Uma cegueira, branca, como um mar de leite e jamais conhecida, alastra-se rapidamente em forma de epidemia. O governo decide agir, e as pessoas infectadas são colocadas em uma quarentena com recursos limitados que irá desvendar aos poucos as características primitivas do ser humano. A força da epidemia não diminui com as atitudes tomadas pelo governo e depressa o mundo se torna cego, onde apenas uma mulher, misteriosa e secretamente manterá a sua visão, enfrentando todos os horrores que serão causados, presenciando visualmente todos os sentimentos que se desenrolam na obra: poder, obediencia, ganância, carinho, desejo, vergonha; dominadores, dominados, subjugadores e subjulgados. Nesta quarentena esses sentimentos se irão desenvolver sob diversas formas: lutas entre grupos pela pouca comida disponibilizada, compaixão pelos doentes e os mais necessitados, como idosos ou crianças, embaraço por atitudes que antes nunca seriam cometidas, atos de violência e abuso sexual, mortes,…

Ao conseguir finalmente sair (devido a um fogo posto na camarata de uma grupo dominante, que instalara ainda mais o desespero controlando a comida a troco de todos os bens dos restantes e serviços sexuais) do antigo hospício onde o governo os pusera em quarentena, a mulher que vê depara-se com a ausência de guarda: “a cidade estava toda infectada”; cadáveres, lixo, detritos, todo o tipo de sujidade e imundice se instalara pela cidade. Os cegos passaram a seguir os seus instintos animais, e sobreviviam como nômades, instalando-se em lojas ou casas desconhecidas.

Saramago mostra, através desta obra intensiva e sofrida, as reacções do ser humano às necessidades, à incapacidade, à impotência, ao desprezo e ao abandono. Leva-nos também a refletir sobre a moral, costumes, ética e preconceito através dos olhos da personagem principal, a mulher do médico, que se depara ao longo da narrativa com situações inadmissíveis; mata para se preservar e aos demais, depara-se com a morte de maneiras bizarras, como cadáveres espalhados pelas ruas e incêndios; após a saída do hospício, ao entrar numa igreja, presencia um cenário em que todos os santos se encontram vendados: “se os céus não vêem, que ninguém veja”…

A obra acaba quando subitamente, exatamente pela ordem de contágio, o mundo cego dá lugar ao mundo imundo e bárbaro. No entanto, as memórias e rastros não se desvanecem.

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Psicologia e Religião



Em suas investigações científicas em torno da mente humana profunda, Jung se deparou constantemente com o fenômeno religioso que chegou a prender seu interesse de tal forma a ocupar um lugar central nos escritos do cientista, especialmente os dos últimos anos. Mantendo-se num plano rigorosamente científico, ele observou acurada e conscienciosamente toda espécie de manifestação daquilo que podemos chamar de fator religioso, tomado em sua amplidão universal, abrangendo, portanto, as representações religiosas tanto do homem primitivo bem como as formas diversas de religiões que se manifestaram nas fases mais avançadas da cultura humana ao longo dos séculos. Após essas investigações, Jung sentiu-se obrigado a reconhecer, “como conteúdos arquétipos da alma humana, as representações primordiais coletivas que estão na base das diversas formas de religião”. Mesmo sem nunca ter falado expressamente de Deus com o propósito de demonstrá-lo, Jung, nesse estudo, admite na estrutura profunda da mente humana uma potencial idade nata que impulsiona o ser humano a procurar a Deus e com ele se relacionar através da religião. A importância desse assunto, analisado pelo enfoque psicológico, adquire maior interesse por ser tratado por C. G. Jung, pioneiro insuperado nas pesquisas da Psicologia Profunda.
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Porque a guerra?




Publicado em 1933, simultaneamente em alemão, em inglês e em francês, pelo Instituto Internacional de Cooperação Intelectual, uma das numerosas emanações da Sociedade das Nações, 'Porquê a Guerra?' é composto por duas longas cartas - uma de Einstein e a outra de Freud, dois dos maiores vultos do século XX. O que pensavam? Como relativizavam a guerra ao falarem um com o outro?


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A Psicanálise dos contos de fadas



Na obra do autor Bruno Bettlheim, A psicanálise dos contos de fadas ele relata e explica através dos contos de o impacto psicológico de situações em acontecimentos envoltos a criança e dando respostas a comportamentos e mostrando a visão infantil a cerca de determinados assuntos. Com essas relações ela tenta passar para a criança ensinamentos para as resoluções de problemas, seu desenvolvimento com inclusão a realidade que os rodeia, pois, ele transmite para o leitor que além de entreter a criança, os contos possuem princípios de importante relevância para o público infantil.

Através de um conto que aparentemente está cercado de imaginação, ou uma história que não é real, onde predomina o maravilhoso pode estar de modo disfarçados os sentimentos que cercam o interior da criança, como o sentimento de raiva ao ser abandonado pelos pais ou na possibilidade de vencê-los em esperteza, passando para a criança mensagens importantes para sua vida, como nunca desistir perante os obstáculos por mais que no início pareçam difíceis. Com relação aos personagens nos contos de fadas e também nas fábulas é perceptíveis características peculiares às crianças com imaturidade e a maturidade destes mostrando a capacidade de controle das emoções ou ser racional.

Além dos contos de fadas e as fábulas também há os mitos, que desempenham um papel oposto aos contos de fadas que se caracterizam pelo otimismo, enquanto o mito é pessimista. Nos mitos como nos contos de fadas existe um ponto em comum que é a existência de fatores internos ao pensamento, muitas vezes ocultos, são a Id, o Ego e o Superego, que se incluem aos sonhos dos espectadores dessas histórias. O mito possui um caráter pessimista, e na maioria das vezes acaba com um final trágico, já nos contos de fadas os protagonistas sempre têm um final feliz. Normalmente no que diz respeito a Id, Ego e Superego, os mitos fazem demonstrações de "solicitações do superego em conflito com uma ação motivada pelo Id e com desejos de autopreservação do Ego" (p 54), com isso, diferenciam-se dos contos que são felizes. Contudo, vale ressaltar que os mitos não fazem parte de toda a formação da personalidade ma somente o que diz respeito ao Superego e os contos na satisfação e nos desejos.

Há histórias nos contos de fadas que aparentemente são bobas e sem importância como no conto dos "Os Três Porquinhos" que mostra as vantagens e a evolução da maturidade através dos três irmãos e suas construções; O caçula da prioridade a uma casa de palha dando importância principal a brincadeira, e não a estrutura e a segurança da casa, o porquinho do meio tem uma maturidade um pouco maior a do irmão menor, porém, ainda não possui um amadurecimento maior a do irmão construindo uma casa de madeira e também dando prioridade as brincadeiras, diferente dos irmãos o mais velho tem um amadurecimento adequado, tendo uma noção maior da realidade dos perigos que podem ocorrer, econstrói uma casa de tijolos pensando na segurançae nos perigos existentes e prevendo a invasão do Lobomau, que se quer fora narrado no início da história.

Algo interessante sobre o surgimento das figuras dos contos de fadas e capacidade de transformação na criança acerca do adulto, especialmente sobre a imagem da mãe, esta quando não dá bronca ou não chama a atenção da criança, no entanto quando esta decidi punir uma mau criação ou a castiga imediatamente ela se transforma na madrasta má e cruel ou ao ser deixada sozinha por uns instantes se sentir maltratada sempre pela mãe que se torna madrasta. A mãe nos contos geralmente esta morta e seguidamente o pai se casa com outra que conseqüentemente finge-se de boa, mas é totalmente má. Essa idéia da morte da mãe nos contos tem seu lado positivo, pois, ela disfarçadamente ensina a criança a lidar com a morte da mãe.

Os contos de fadas em algumas histórias possui vários significados mostrando os conflitos internos aos protagonistas assim como aos leitores que podem se destruírem por acontecimentos que não são superados podendo como conseqüência causar danos destrutivos a essas pessoas, como no conto das Mil e uma noites, onde o rei Xazenã ao ser traído por sua esposa não mais confia em ninguém casando-se e matando suas esposas até se casar com Xerazade que estimula seus desejos internos para se salvar da morte. Estando com isso clara manifestações de Id, Ego e o Superego dos protagonistas, Ego sendo movido pelo Superego, que é representado no conto com a Xerazade, o rei com seu Id incontrolado até encontrar o seu Ego.

É interessante destacar a visão de anulação dos contos de fadas pelos pais que fecham a visão do que esta intrínseca nos contos, escondendo ou não acreditando neles tirando muitas vezes da criança o desejo de sonhar. Todas as histórias possuem suas características na fantasia como a visão do herói que sempre se da bem no final e o castigo que ocorre com os maus. Elas mostram os impulsos reais e como é difícil aceitar a imaginação que cerca os contos, e também destacam a realidade como no conto de João e Maria que no início da história mostra as dificuldades dos pais deles para criá-los, fato que esta visível aos olhos da humanidade que muitas vezes os tornam amargurados e modificam sua personalidade.

No conto da Chapeuzinho Vermelho esta relatada a inocência da pequena menina ao visitar a sua avó pelo bosque e o Lobo com sua personalidade frustrada a mal estruturada que acaba engolindo a menina que para alegria da crianças é retirada da barriga do Lobo, ensinando a criança a obedecer seus pais e a serem cuidadosas não seguindo por caminhos que podem ser perigosos.

Com relação aos contos de fadas estas passam ensinamentos de extrema importância para as crianças mostrando conflitos ocultos e também problemas relacionados aos pais como no Mito de Édipo ou Edipiano que mostra, no início a profecia de um oráculo que diz que ele matara o pai e se casara com a mãe. No complexo de Édipo causado pelos acontecimentos ao personagem relata em grave problema nas crianças, que lutam no seu desenvolvimento para se livrarem desses sentimentos e angustias.

Contudo da para notar a importância dos contos de fadas para a demonstração dos sentimentos infantis para encontrarem e formarem suas identidades seu desenvolvimento ao que se refere à maturidade, suas preocupações internas, enfim, sua percepção do mundo e o crescimento da sua personalidade.


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Vinte Poemas de Amor e uma Canção Desesperada




Vinte Poemas de Amor foi a obra que marcou a juventude do autor Pablo Neruda e, ainda que escrito às vezes em Santiago do Chile, essa obra tem como fundo a paisagem do Sul, especialmente, os bosques de Temuco, as grandes chuvas frias, os rios e o selvagem litoral sulino. Inspirado em uma pessoa que amou na época, cantou principalmente o amor e a sexualidade, mas fez referências à saudade, à solidão, aos sonhos e às tristezas como elementos figurativos de seu inconsciente, como desejos que persistem enquanto há vida (“Corpo de mulher, brancas colinas, coxas brancas, / pareces com o mundo na tua atitude de entrega. / Meu corpo de lavrador selvagem te escava / E faz saltar o filho do fundo da terra”, Neruda, p. 42) (“Mas cai a hora da vingança, e te amo. / Corpo de pele, musgo de leite ávido e firme. / Ah os copos de peito! Ah os olhos de ausência! / Ah as rosas do púbis! A tua voz lenta e triste!”, Neruda, p. 43).

Em Freud (1976), para cada indivíduo, os primeiros objetos sexuais são os da infância. Todos os objetos sexuais subseqüentes são edições posteriores daqueles. A paixão de Neruda por essa jovem está baseada em alguma figura, que na infância, inconscientemente, o excitava, tendo mais tarde vivido conscientemente essa fantasia com a mulher amada. Percebe-se como é poderoso e duradouro o efeito dos desejos da infância sobre a vida sexual adulta de uma pessoa (“Sinto viajarem teus olhos e é distante o outono: / boina cinzenta, voz de pássaro e coração de casa, / para onde emigram os meus mais profundos desejos / e caíam os meus beijos alegres como brasas” // “Céu (visto) de um navio. Campo (visto) dos montes. / Tua lembrança é de luz, de fumaça, de lago em calma! / Mais para lá dos teus olhos ardiam os crepúsculos. / Folhas secas de outono giravam na tua alma”, Neruda, p. 44).

Nesse poema, o poeta participa, segundo Freud (1976), de uma crença animista quando volta ao pensamento infantil que toma parte importante na magia. Todos os objetos do meio de uma criança são inicialmente aceitos como tendo pensamentos, sentimentos e desejos, assim como ela. Toda a natureza está animada até que a experiência e seus pais lhe digam o contrário. São vestígios dessa crença que persistem em áreas da vida adulta do autor.

Salienta-se que o fato de ser escritor não o difere de outras pessoas na relação entre devaneios e desejos inconscientes. Pode-se dizer que o inconsciente é um lugar psíquico especial que deve ser entendido como um sistema de energia específica. É principalmente o lugar onde estão os conteúdos quase sempre reprimidos. Reprimidos porque os objetos se vão e deixam o sofrimento, porque os conflitos obrigam a abandonar os desejos. O simbolismo surge como resultado do conflito intrapsíquico e as tendências repressoras e o reprimido. Somente o que é reprimido necessita ser simbolizado. Pode-se relembrar um dos pensamentos fundamentais da psicanálise, expresso por Lacan (1998): “Somos lá onde pensamos e pensamos lá onde não somos.” O pensamento ajuda a existência, mas é a existência que pesa no pensamento, pede auxílio quando sofre, enquanto tem dores, enquanto sente faltas. Não há duvidas de que essa obra possui um valor estético e poético que transcende em nossos dias.

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quarta-feira, 7 de julho de 2010

Freud, a Psicanálise e a Literatura







Vanguardas Européias

Dom Casmurro - clip do livro

Totem e Tabu



Em Totem e Tabu Freud compara os ritos de povos primitivos com a neurose, relacionando o significado original do totemismo com o processo pelo qual passa o desejo inconsciente.


O totem (divinização de escultura representando plantas, animais ou antepassado) pode ser definido como instituição primitiva que deixou indícios nas religiões ritos e costumes dos povos civilizados contemporâneos e o tabu (o mais antigo dos códigos não escritos da humanidade) compreende prescrições rigorosas cuja violação traz sérias conseqüências e castigos para os membros de um grupo. Ao que tudo indica, o totem define uma consagüinidade na qual se inscreve uma lei para deter o indivíduo ante o incesto. Por isso Freud considera a renúncia como a base para o tabu.


Evidências encontradas na linguagem e nos costumes apontam para a realidade histórica do matrimonio em grupo em tempos remotos, o que torna compreensível o rigor na proibição de relações sexuais com indivíduos pertencentes ao mesmo totem.


Tanto quanto os povos selvagens, o castigo prescrito pelo tabu relativos a contato com objetos interditados são formas de tornar o objeto impossível. Para Freud é a expressão de desejos inconscientes e dos temores em relação a estes desejos. (desejo de tocar e ao mesmo tempo horror e proibição).


Esta atitude ambivalente, Freud a encontra também no sujeito neurótico: como temem porque desejam tudo o que entra em contato com o proibido fica tão proibido quanto. A proibição recai sobre todos os novos fins eleitos pelo desejo, refletindo desta forma o processo pelo qual passa o desejo inconsciente. É este o paradoxo do cerimonial sem fim dos obsessivos: pretendem interditar o desejo inconsciente mas aproximam-se cada vez mais dele.


Merece especial consideração neste texto o exame feito sobre o tabu que recai sobre as pessoas mortas: as pessoas que tocaram os mortos devem ficar isoladas, o nome do morto não deve ser pronunciado. Isto indica que admitem uma coincidência entre objetos e palavra o que coincide com as descobertas de Freud que insiste na importância dos nomes no pensamento inconsciente. Na vertente psicanalítica, as auto-reprovações no luto falam de um desejo inconsciente de morte. A ambivalência é uma característica da neurose obsessiva e o tabu nasce no terreno da ambivalência afetiva. É neste ponto que os neuróticos obsessivos se comportam como os selvagens.


As fases do deslocamento neste processo:
1)desejo de morte
2)recalque por proibição
3)a proibição fica enlaçada a um determinado ato que como consequência de deslocamento se substitue ao ato primitivo orientado contra a pessoa amada. Desenvolvimento ulterior: o desejo de morte é transformado em temor de que a pessoa morra.


Os pontos em comum são a extensão do tabu do morto a tudo que entrou em contato e o excesso de cuidados. A excessiva proteção dos reis por exemplo, revela uma hostilidade dissimulada. Na elaboração conclusiva, Freud aproxima a figura do pai como o alvo deste desejo de morte. A atitude do selvagem seria uma derivação da atitude infantil em relação ao pai. Através do mito da horda primitiva Freud revela que este desejo é fundante do inconsciente no homem.
Fonte:
http://pt.shvoong.com/humanities/1797246-totem-tabu/






Édipo Rei




Composta por Sófocles, em data ignorada, e particularmente admirada por Aristóteles, esta obra-prima da tragédia grega, ilustra a impotência humana diante do destino.

A estória começa quando Édipo, príncipe de Corinto, é insultado por um bêbado, que o acusa de ser filho ilegítimo do Rei Políbios. Embora Políbios procure tranqüilizar Édipo, o príncipe, perturbado, recorre ao Oráculo de Píton, mais tarde conhecido como Delfos. O oráculo evita responder à sua dúvida, mas dá a terrível informação de que Édipo está destinado a matar o pai e casar-se com a mãe. Como Édipo não tem a menor intenção de deixar que isso aconteça, ele foge de Corinto e vai para Tebas. E aí começa a tragédia.Em uma encruzilhada, Édipo depara-se com uma carruagem. À frente vem o arauto, que ordena rudemente a Édipo que se afaste e tenta empurrá-lo para fora da estrada. O príncipe começa uma briga e termina matando todo mundo que nela se envolve. Para sua desgraça, um dos homens que vinha na carruagem era seu pai verdadeiro, o rei Laios de Tebas. Após resolver o enigma da esfinge e salvar Tebas desse flagelo, Édipo é proclamado rei e casa-se com a viúva de Laios, Jocasta, sua mãe verdadeira. Só depois que uma nova maldição cai sobre Tebas, maldição que seria afastada apenas quando o assassino de Laios fosse descoberto e expulso, é que os fatos vêm à tona. Édipo não consegue suportar a verdade e arranca os próprios olhos.

Antes que Édipo tomasse a decisão de fugir da profecia do oráculo, Laios, sua vítima já tinha cometido o mesmo engano. Apolo havia advertido Laios de que seu próprio filho o mataria e, quando Édipo nasceu, o rei mandou perfurar com um cravo um dos pés da criança e abandoná-la em uma montanha. Mas o menino foi encontrado por um pastor e levado ao rei Políbios, que o adotou. Essa foi a origem da confusão de Édipo e foi daí que veio seu nome: "oidípous" significa "pé inflamado".

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O Primo Basílio




Enredo
Jorge, bem-sucedido engenheiro e funcionário de um ministério e Luísa, moça romântica e sonhadora, protagonizam o típico casal burguês da classe média da sociedade lisboeta do século XIX. Casados e felizes, falta apenas um filho para completar a alegria do "lar do engenheiro", como era chamada a residência do casal pela vizinhança pobre.


Existe um grupo de amigos que frequenta o lar de Jorge e Luísa: D. Felicidade, a beata que sofre de crises gasosas e morre de amores pelo Conselheiro; Sebastião, amigo íntimo de Jorge; Conselheiro Acácio, o bem letrado; Ernestinho e as empregadas Joana – assanhada e namoradeira – e Juliana – revoltada, invejosa, despeitada e amarga, responsável pelo conflito do romance.


Ao mesmo tempo que cultiva uma união formal e feliz com Jorge, Luísa ainda mantém amizade com uma antiga colega, Leopoldina – chamada a "Pão-e-Queijo" por suas contínuas traições e adultérios. A felicidade e a segurança de Luísa passam a ser ameaçadas quando Jorge tende a viajar a trabalho para Alentejo.

Após a partida de seu esposo, Luísa fica enfadada sem ter o que fazer, no marasmo e em melancolia pela ausência do marido e exactamente nesse meio-tempo, Basílio chega do exterior. Conquistador e "bon vivant", o primo não leva muito tempo para conquistar o amor de Luísa (eles tinham namorado antes de Luísa conhecer Jorge). Luísa era uma pessoa com uma forte visão romântica da vida, lia apenas romances, e Basilio apresentou-se como a chave para seus sonhos: era rico, morava na França. O amor inicial transformou-se em ardente paixão e isso faz com que Luísa pratique adultério. Entrementes, Juliana espera apenas uma oportunidade para apanhar a patroa "em flagrante".

Os encontros entre os dois sucedem-se a par da troca de cartas de amor, uma das quais é interceptada por Juliana – graças aos conselhos "sábios" de tia Vitória –, que começa a chantagear a patroa. Transformada de senhora mimada em escrava, Luísa começa a adoecer. De frágil constituição, os maus tratos que sofre de Juliana tiram-lhe rapidamente o ânimo, minando-lhe a saúde.

Jorge volta e de nada desconfia, pois Luísa satisfaz todos os caprichos da criada, enquanto tenta todas as soluções possíveis, até que encontra a ajuda desinteressada e pronta de Sebastião, o qual, armando uma cilada a Juliana, tentando levá-la presa, acaba por provocar-lhe a morte. É um novo tempo para Luísa, cercada do carinho de Jorge, Joana e da nova empregada. Porém, já é tarde demais: enfraquecida pela vida que tivera de suportar sob a tirania de Juliana, Luísa é acometida por uma violenta febre. Acamada pelas altas febres, Luísa não nota que Basílio lhe responde a uma carta escrita a meses, e quando o carteiro entrega a carta na sua residência, chama a atenção de Jorge por estar endereçada a Luísa e ser remetida de França, motivo pelo qual ele a abre e descobre o adultério da esposa nas palavras amorosas e cheias de saudade de Basílio. A evidência da traição fá-lo entrar em desespero mas, no entanto, perdoa-lhe a traição pelo forte amor que lhe tem e pelo seu frágil estado de saúde. De nada adiantam os carinhos e cuidados do marido e dos amigos, nem o zelo médico - que chegou a raspar-lhe os longos cabelos - de que foi cercada.

Luísa morre e o "lar formalmente feliz" desfaz-se. O romance termina com a volta de Basílio - o qual fugira, deixando-a sem apoio - e seu cinismo, ao saber da morte da amante: comenta com um amigo que "antes tivesse trazido a Alphonsine". Esta parte encerra o livro explicitando o mau caráter de Basílio. Enquanto caminhavam pela rua, o seu amigo Visconde Reinaldo, censurava Basílio por ter tido um romance com uma "burguesa", sem distinção. Não era, como ele mesmo dizia,uma amante chique, pelo contrário "não possuía relações decentes", "casara com um reles individuo de secretaria" e "vivia numa casinhola". Achava a relação absurda,no final das contas. E arrisca dizer que Basílio fizera o que fizera, por "higiene". Ao responder "Que ferro! Podia ter trazido a Alphonsine", Basílo confirma a suspeita do amigo. Luísa fora usada, então. Não houve qualquer sentimento. Luísa morrera, portanto, sem nunca ter sido amada por Basílio.

Tempo
O tempo da narrativa é cronológico e a narrativa linear, ocorrendo no período entre o namoro de Luísa, a morte da mãe, o abandono pelo namorado, estendendo-se pelos três anos de seu casamento com Jorge, até a viagem e volta desse. A acção passa-se no final do século XIX.

Foco narrativo

Apresenta um narrador omnisciente, que não consegue distanciar-se por completo de suas personagens, o que se caracteriza pela sua omnisciência e pelo emprego do enredo da obra. Descreve detalhes mínimos de objetos ou vestuário, colocando o leitor dentro da cena de maneira realista.

Espaço
Lisboa é o cenário da crítica de Eça de Queirós; é o espaço da sociedade lisboeta por onde transitam as personagens e onde elas expõem suas condições sócio-económicas e históricas. O Alentejo é o espaço que rouba Jorge de Luísa, deixando-a num marasmo sem fim. Paris é o cenário que devolve Basílio à Luísa, trazendo alegria e a novidade de uma vida de prazeres e aventuras.

Lisboa é por onde transitam as personagens e onde elas expõem suas condições sócio-económicas e históricas, é a sociedade portuguesa. Dentro desta cidade, a casa de Luísa e de Jorge e o Paraíso são os que ganham maior destaque.

Estilo

O livro contém uma linguagem culta e extremamente correcta, sendo o vocabulário rico e irónico. A linguagem é empolada e artificial, típica do romantismo. Impregna-se o texto de Eça de Queirós de uma plasticidade admirável e perfeita.

Os processos descritivos espaciais, em Queirós, não são simples palcos em que se instalam os sujeitos do relato: integram o caráter, o perfil das personagens.

Conclusão

Diante do cenário histórico, descrito no início dessa análise, Eça de Queirós publica, em 1878, O Primo Basílio. O livro inova a criação literária da época, oferecendo uma crítica demolidora e sarcástica dos costumes da pequena burguesia de Lisboa. Eça de Queirós ataca uma das instituições consideradas mais sólidas: o casamento. Com personagens despidos de virtude, situações dramáticas geradas a partir de sentimentos fúteis e mesquinharias, casos amorosos com motivações vulgares e medíocres – tudo isso, ao mesmo tempo em que tece críticas, desperta o interesse da sociedade de Lisboa. Eça de Queirós explora o erotismo quando detalha a relação entre os amantes. Inova também ao incluir diálogos sobre a homossexualidade. O autor, que já mostrara sua opção por uma literatura ácida e nada sentimental em O Crime do Padre Amaro, cria personagens fisicamente decadentes – cheios de doenças e catarros – e de comportamento sexual promíscuo.


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